Shetel Típico

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Melamed no Cheder

melamed cheder

Trem para os Campos de Exterminio

trem campo

Capa de Chalot de Shabat

shabat imag

Canção de Shabat



IMAGINAÇÃO


Estou correndo pelas ruas enlameadas do meu “Shtetel” (vilarejo), com o meu quepe azul, calças curtas também azuis, presas por suspensório, camisa branca, meias que eram brancas quando as vesti e sapatos pretos com sola furada. Os “Tsitsit” (franjas) do meu “Talit Catan” (vestido por baixo da camisa) balançam para fora da calça. Esse é o uniforme de todos nós, meninos do “Shtetel”. Quase todos estão correndo também, pois já estamos atrasados para as aulas no “Cheder” (escolinha).

Aliás estamos sempre atrasados e o “Melamed” (professor) nos dá, a todos, um “carinhoso” puxão de orelhas que, mesmo assim, dói. Mas estamos todos alegres, felizes por estarmos ali e por estarmos todos juntos. Somos todos pobres, mas muito felizes.

Meu pai é sapateiro. O pai do Yossel, meu melhor amigo, é alfaiate e o pai do Duvid é açougueiro. Todos se conhecem no “Shtetel”. Todos os adultos têm uma profissão e trabalham muito duro, das primeiras horas da manhã até depois de escurecer. São horas e horas ininterruptas. Mas a compensação é grande quando chegam em casa e vêem aquele bando de filhos e a mulher sempre com um sorriso a recebê-los e o jantar pronto.

As casas são todas muito simples e pouco espaçosas. Em casa somos seis, três meninos e três meninas. Há uma divisão para os meninos, que dormem um ao lado do outro e outra para as meninas. Há apenas uma porta, que dá para o quarto dos meus pais. O piso é de cimento e, no inverno, não dá para pisar descalço nele, pois é como se estivesse pisando em gelo.

Mamãe ajuda na “Parnassá” (sustento), vendendo doces feitos por ela e as meninas e volta cedo para casa para colocar mais água na sopa e cozinhar as batatas e algumas beterrabas ou cenouras. Carne, nem pensar. Isso nos dias de semana. No “Shabat”, um “banquete”.

Mas primeiro os preparativos para o “Shabat”. O “cheder” termina mais cedo, papai fecha a sapataria logo depois do almoço e estamos todos em casa no início da tarde. No inverno, principalmente, o “Shabat” começa muito cedo. A sexta-feira é muito curta. Juntamos toda a nossa roupa de “gala” em honra ao “Shabat”. Camisa, calça, meias, tudo limpo e vamos todos para a “Micve” (banho ritual) para nos purificarmos para o “Shabat”. Eu e meus irmãos vamos com papai. Nos vestimos com a nossa roupa limpa e cheirosa (não a fedorenta do dia a dia) e seguimos para o “Shil” (sinagoga) para o “Kabalat Shabat” (Saudação do Shabat).

Voltamos o mais rápido que podemos, porque estamos esfomeados e sabemos que a mamãe deve ter preparado uma comida muito gostosa. Chegamos em casa cantando o “Shalom Aleichem Malachei Hamelachim” (recebemos os anjos bons e também os maus, pois é Shabat). As meninas entoam juntas e após o “Kidush” (benção do vinho) e o “Motsi” (benção das chalot), começamos a comer.

Mamãe juntou todas as economias da semana para comprar uma galinha e um pedaço de peixe e preparou um verdadeiro “banquete”. Todo Shabat ela inventava uma coisa diferente para nos agradar. E sempre conseguia. Era, afinal, uma “Yidishe Mame” (uma mãe judia).

Se no Shabat ela se esmerava, em “Rosh Hashaná” (ano novo) ela ficava devendo ao padeiro, ao açougueiro, ao mercador de legumes e vinhos, mas preparava uma refeição digna dos Rothschild. E no Seder de Pessach, então, vocês nem imaginam!!!

E fui crescendo nesse ambiente difícil mas gostoso e feliz. Um dia, estava começando a clarear, quando fui acordado por ruídos de caminhões e carros blindados. Na frente, dois homens uniformizados gesticulando muito dão ordens aos soldados fortemente armados que seguem atrás. A rua se enche de pessoas, homens, mulheres, crianças, todos assustados, sem saber o que está acontecendo. Aos berros dois soldados de capacetes e botas altas começam a gritar e eu ouço somente “Schnell, Schnell” (rápido, rápido). Nisso meu pai nos reúne e diz que vamos viajar, que precisamos preparar as nossas malas o mais rápido possível. Eu pergunto para onde vamos, eu que nunca havia viajado. Meus pais não me respondem. Os berros de “Schnell, Schnell” continuam incessantemente.

Descemos todos, com malas e sacolas, nós e todos os demais moradores da nossa rua e seguimos para um caminhão, para dentro do qual somos empurrados pelos soldados uniformizados que falam uma língua parecida com o “yididh”, e eu consigo entender algumas poucas palavras. “Schwein Jude” (judeu porco) entendo claramente. No fundo estou meio sem saber o que sentir. Uma viagem, uma viagem? Puxa, eu que nunca viajei. Será que vai ser bom?

O caminhão segue até a estação de trem. De vários caminhões praticamente todos os habitantes do “shtetel” descem e são empurrados para dentro de trens, que parecem trens de gado. Não há bancos nem assentos. Nada. E os gritos dos soldados, agora com os rifles apontados em nossa direção, não param. São cada vez mais fortes!!!!

Será que isso tudo é imaginação?